segunda-feira, 13 de maio de 2019

A Abolição da Escravidão em Santa Cruz

João Corrêa


O dia 13 de maio de 1888 é uma data emblemática para a sociedade brasileira. É um marco na história do Brasil, na qual o país deixava de ser uma nação escravocrata.  Mas para os escravos da Imperial Fazenda de Santa Cruz, este processo histórico foi um pouco diferente.

Os escravos da Fazenda de Santa Cruz foram libertos pela Lei do Ventre Livre de 1871. Esta lei além de conceder a liberdade aos filhos de escravas que nascessem a partir daquela data, também abrangia os escravos da nação.

Escravo da nação era o nome dado aos escravos que estavam em usufruto do império brasileiro. Estes escravos eram empregados em diversos estabelecimentos públicos do império, na qual eram utilizados em serviços de diversas magnitudes.  Como exemplo podemos citar órgãos como: Fábrica de pólvora; Arsenal de Marinha; Fazenda Piauí e principalmente a Imperial Fazenda de Santa Cruz, onde tinha o maior quantitativo de escravos.

A Fazenda de Santa Cruz nos seus momentos áureos chegou a ter uma escravaria de 3 mil escravos. No ano de 1871, segundo documentação pesquisada, foram libertos pelo império brasileiro em torno de 1200 escravos. Após este período a vida dos libertos se tornou muito difícil, para aqueles que tentaram de alguma forma permanecer na sede da Fazenda ou nos arredores.

Verificamos que muitos libertos se dirigiram para outras regiões, mas segundo as documentações pesquisadas não sabemos os destinos destes. Os que aqui permaneceram, sofreram com as diversas retaliações vindas dos administradores da Fazenda, que em certa medida dificultava a vida dos libertos nas imediações de santa Cruz.  Constatamos que os libertos sofreram com a concorrência da mão de obra imigrante que estavam chegando para região, isso se mostra evidente nos jornais da época, na qual mostra conflitos envolvendo libertos, imigrantes e moradores locais.

Percebe-se que os libertos somem dos registros oficiais, na qual se torna muito difícil buscar encontrar indícios deles e como eles buscaram formas de sobrevivência para esta nova fase de suas vidas. Neste hiato de tempo entre 1871 a 1891, encontramos poucas informações sobre a atuação dos libertos, somente informações que versavam sobre os conflitos entre libertos e demais moradores. No ano de 1891, encontramos uma ordem de despejo por parte do ministro da Economia, na qual determinava a expulsão dos libertos das antigas senzalas da Fazenda, segundo matéria do jornal ainda residiam em Santa Cruz em torno de 600 libertos.

Vale apontar que os libertos de Santa Cruz ficaram à mercê da sociedade da época, ficaram sem terras, emprego, moradia, sofrendo retaliações pela administração da Fazenda, concorrência na procura de um emprego e principalmente a expansão urbana que Santa Cruz estava sofrendo, não dando espaço para os libertos permanecerem no local que suas gerações viveram por mais de 300 anos.

A situação dos libertos de Santa Cruz é um tema que precisa ser mais aprofundado para compreendermos o destino destas famílias e também para entendermos como se deu este processo pós abolição na região. Mas até agora podemos concluir que de modo algum foi um processo benéfico para os negros libertos.

João Batista Corrêa é Historiador.
Graduado e Mestre em História pela Universidade Salgado de Oliveira (UNIVERSO), é autor do livro "Escravidão e Liberdade na Imperial Fazenda de Santa Cruz (1856-1891)", que pode ser adquirido pela Editora Multifoco no link:

Contatos:


E-mail: jobacorrea@gmail.com

Legenda e Fonte da Imagem: 
Escravos negros trabalhando numa plantação de café (c. 1860-1888), disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/amp/brasil-44091474 , acesso em 13/05/2019.

3 comentários:

  1. Esse processo de não oferecer nada aos libertos, além da liberdade em si, é algo que se notou também em São Paulo e - porque não dizer - em vários países. Estão libertos. Pronto. E só. Mas o preconceito e a falta de condições de sobrevivência, o abandono social e o descaso para com eles, é algo que entristece qualquer pessoa de bom senso.
    É fácil entender porque não há registros desses libertos por mais de 20 anos: simplesmente não tinham nenhuma cidadania, nenhum direito, nada além da própria vida e olhe lá.
    Sessões de Bibliotecas inteiras já foram escritas ao redor do mundo sobre esse assunto, e ainda assim, poucos progressos feitos, no sentido de melhorias.
    Minha vó materna chegou ao Brasil, vinda de Gênova, em 1893,aos 7 anos de idade. Foi para uma fazenda, no interior de Ribeirão Preto - SP, e lá ainda estavam alguns dos escravos libertos, que contavam histórias terríveis. Ainda havia a senzala, com seus côchos, e o temido tronco, cercado de correntes, e haviam fazendas, onde sequer os escravos sabiam que estavam libertos, que a Lei Áurea havia sido assinada há anos!
    Triste país, onde ainda há quem se refira aos negros com palavras pejorativas, atitudes desprezíveis e fingem uma suposta normalidade...

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  2. Prezada Jane Darckê
    Seu relato ajuda a comprovar que infelizmente pouca coisa mudou. Não só aqui no Brasil, mas também em outras partes do mundo.
    Realmente é uma triste realidade.

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  3. Infelizmente, a maioria dos negros foi tirada da escravidão e condenada à marginalidade social. A mudança do Império para República no ano seguinte à abolição, certamente que contribuiu para esse agravamento.

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